Uma Reflexão Sobre a Poesia de Valter Hugo Mãe (Parte 7)

Descrição

Em 'receberei deus estendidas' é possível perceber vários pontos que caracterizam o estilo de MÃE no que diz respeito a estrutura de seus poemas - o caráter fragmentado de seus versos é um deles. Ao cortar os versos antes que se complete um sentido linear, as estrofes de MÃE são construídas e reconstruídas à medida que o poema vai sendo lido. Ao separar a palavra 'apetite' como um único verso, o autor dá destaque a idéia que o eu-lírico deseja fortalecer - criar bocas para cada apetite. O fato da palavra 'deus' também aparecer em letras minúsculas pode ser compreendido, pelo menos, por dois caminhos diferentes: um primeiro olhar poderia encarar (observando os poemas do autor de uma forma geral) como uma característica apenas estrutural, o que seria um erro, pois diminuiria a importância do todo para a construção do poema. A segunda opção é fazer uso de uma análise mais profunda - um olhar mais atento, analisando de uma forma mais complexa, poderia achar vários outros caminhos. O eu-lírico coloca num mesmo patamar a importância de 'deus', pela maneira como o apresenta, a todos os elementos que aparecem em sua fala - como as paisagens doadas ao 'seu coração índigo', sua 'boca' criada para o 'apetite' etc. Dessa forma, o poema estaria ironizando e provocando o 'deus' que lhe doa as paisagens e que ele, o eu-lírico, voraz, abocanha 'elevado na montanha'. É esse jogo, que mistura sarcasmo, resignação e dúvida, essa forma de ousar no tratamento e na reflexão sobre 'o sagrado', que confere ao autor a afirmação de Alécio CUNHA quando diz que 'a poesia de Valter Hugo Mãe é diabólica', ou ainda como aponta Urbano Tavares RODRIGUES sobre o poeta possuir uma 'escrita mágica, suave-cruel'.